sábado, 1 de dezembro de 2012

A GIBOIA E O HIPOPÓTAMO


 

 

A GIBÓIA E O HIPOPÓTAMO

 

 

Naquele dia o pai Hipopótamo, habitualmente sisudo, estava radiante dando voltas e mais voltas às cinco palmeiras do seu acampamento, enquanto a mãe, roncava baixinho aconchegando o seu bebé de cinquenta quilos acabadinho de nascer.

Depressa se espalhou a notícia do feliz acontecimento, e até o Sol apareceu a espreitar surpreendido, por cima da floresta.

Ora o nascimento do bebé foi um acontecimento extraordinário, pois naquele ano já o tempo das chuvas ia adiantado e ainda não tinha nascido nenhum filhote de hipopótamo. Para festejar, os pais convidaram todos os animais da ilha de Uno.

Todos… não foi bem assim, pois esqueceram-se da vizinha Gibóia, que morava nas palmeiras mesmo por cima do acampamento.

Não foi por mal, não! Mas no meio de tantas preocupações, há sempre alguma coisa que fica esquecida.

Acontece, que a Gibóia não esteve com meias medidas e ficou muito ofendida.

“Que não havia direito, assim e assado… que até o Porco-Espinho fora convidado, e a Gazela, e o Lagarto, e a Formiga… Sim, até a minorca da Formiga! Mas não, o assunto não ficava arrumado, não senhor!

E então resolveu vingar-se.

Os convidados continuaram a chegar com prendas para o recém-nascido;

O Porco-Espinho trazia um alfinete para as fraldas, a Formiga trazia um grão de arroz, a Abelha uma gota de mel, e assim por diante, cada um com aquilo a que dava mais valor.

Então, silenciosamente como só as cobras são capazes, a Gibóia deslizou tronco abaixo até ao chão, resolvida a abocanhar aquele pitéu tão tenrinho. Foi-se chegando, chegando…

Já se encontrava atrás da mãe e faltava só o “salto de uma cobra” para apanhar o petisco. Encolheu-se para tomar balanço e atingir a presa.

Um, dois, e…três! Foi como uma mola esticada de repente. CATRAPUZ!

Catrapuz, não! Porque o salto não chegou ao fim. A ponta da sua cauda ficou presa.

- Ai ai, minha cauda! – Gritou ela aflita enquanto se virava e dava de caras … com quem?

Bom! É que o senhor Hipopótamo andava por ali no meio dos convidados, a ver se estava tudo bem, quando avistou a intrusa e percebeu num instante, o que ela se preparava para fazer. Um, dois, e…três! Pisou-lhe o rabo.

E aí vai ela, a Gibóia, a correr ao longo da praia gritando:

- Ai quem me acode, pisaram-me o rabo! Ai ai, quem me acode?

Correu gritando e encontrou um Rochedo, que era o mais antigo habitante da ilha.

- Que foi Gibóia, porque gritas?

- Foi o Pescabalo que me pisou, e a dor não passa.

- Mas porque faria ele isso?

- Bem, isso é cá comigo.

- Ai é? Então morde na cauda até doer muito, que a dor da pisadela passa.

A cobra assim fez, mas a dor não passou, e lá foi ela veloz pela orla da floresta ao longo da praia.

Lá mais adiante encontrou um Poilão, que é a árvore maior que todas as outras.

- Que foi Gibóia, porque gritas?

- Foi o Peixe Cavalo que me pisou, e o Rochedo disse para eu morder a ferida, mas a dor não passou.

Mas o que foi que tu fizeste ao Hipopótamo?

- Não tens nada com isso.

- Ah, não? Então foge mais o depressa que puderes, que a dor fica para trás.

E lá foi ela mais depressa ainda, mas a dor não a largava.

Pouco depois encontrou o Fogo que andava a pastar no capim seco.

- Que foi Gibóia, porque gritas tanto?

- Foi o Cavalo-Marinho que me pisou, e corro a ver se a dor fica para trás mas não fica. Que hei-de eu fazer?

- Olha, eu não sei, mas além naquele palmar está muita gente junta, pode ser que alguém te cure.

Então a Gibóia, chegou a um acampamento onde havia muitos animais, ainda encandeada pelo Fogo e quase virada do avesso pelo cansaço.

O chefe do lugar perguntou-lhe:

Então Gibóia, o que foi que te aconteceu?

Ah, foi um monstro que me pisou a cauda, a dor não passa e eu não sei que fazer.

- Mas que fizeste tu para seres tão maltratada? Vá…conta lá!

Empertigando-se, humilhada e enraivecida ainda, quase esquecida da dor, disse despeitada sem perceber com quem estava a falar:

- Eles não me convidaram para a festa e eu ia comer-lhes o filho para me vingar.

- Ah, foste tu, bicho mau? Pois primeiro pisei-te o rabo, agora piso-te a cabeça. - Disse o pai Hipopótamo caindo-lhe em cima.

A Gibóia, que tinha dado a volta à ilha sem o saber, nunca mais se queixou que lhe doía a cauda.

 

Bissau 1980

Fernando Fonseca

 

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