CONSCIÊNCIA
(motivado pelo texto “OS DIAS DA MEMÓRIA E DA INTERROGAÇÃO”
de Anselmo Borges – DN 02nov2013)
A consciência é
“coisa” imaterial. Há a consciência individual, e consciência colectiva que se
revela na individual, sendo que a colectiva é, mais do que a primeira, de cariz
cultural.
A consciência
individual é transitória e finita. O que permanece, são as suas consequências
na consciência comum; na comunhão das consciências.
O espaço do
colectivo é o lugar (imaterial, mais uma
vez) onde se caldeiam as consciências, onde se aferem e onde se criam,
refundem e formulam como coisa dialética, novas consciências.
A ideia de quem
somos, porque somos e como somos, constitui o triângulo da consciência. A
capacidade de nos vermos “por fora”, a noção da nossa finitude individual e
provavelmente enquanto espécie, dá-nos uma perspectiva que os gnósticos acreditam
ter uma finalidade determinada por uma “certa” vontade divina.
Sugeri, na
circunstância do desastre de Chernobyl, (Abril de 1986) que o destino último
dos humanos é o de seremos “fazedores de
estrelas”, conseguindo com esse acto último, aproximarmo-nos ou
confundirmo-nos com os atributos de Deus. E como Deus a existir, seria
intemporal, a humanidade toda unificar-se-ia com a divindade ao tornar-se
igualmente intemporal, pela dispersão física e regressão dos átomos que nos
constituem ou com a criação de novos, assim como do sítio cósmico que
habitamos.
Ora sendo a
consciência imaterial, poderia admitir a sua persistência para além do
apocalipse? Isso não me parece provável, porque tal como o projecto só existe a
partir do risco do arquitecto, e o mais belo dospensamentos só existe a partir
do momento em que lhe é dado um corpo, tal como a grandiosidade da obra só se
manifesta pela utilização da pedra ou do aço pois não basta o pensamento do
autor para que exista, do mesmo modo, a consciência é suportada por processos
físico-químicos.
Mesmo que tal fosse
possível, como nos podemos atrever à afirmação ou mera suspeição de que a
consciência seria a última, única e perene “pegada” da humanidade?
Na ausência de quem
pudesse testemunhar a intemporalidade última da consciência para lá da
destruição física do consciente, parece-me fútil, inconsequente e
intelectualmente desonesto, que contornando a questão da fé, afirmar (porque a
afirmam), a “eternidade” dessa componente da condição humana.
No mundo da fantasia,
tudo podemos conceber, mas libertos da ingenuidade infantil de acreditar serem
reais os desenhos animados. Na verdade eles existem, mas com a sua qualidade
própria de produto fantasiado.
A fé só por si, não
pode dar cobertura a tudo, sobretudo quando se criam postulados que não são
comprováveis. Só o que é testemunhável ou comprovável pode ser afirmado.
Coisa distinta e que
não nego, é o direito de cada um fantasiar uma hipotética “tábua de salvação”
partilhando a sua fantasia, como eu próprio partilho as minhas, mas que o bom
senso me impede de impor como verdade.
Vela Latina 03nov2013.09.10
“ Na morte o homem é confrontado com o nada e
angustia-se face a algo de concreto que nos ameaça e de que temos medo”.
Quando chegar a minha hora, se eu tiver a
consciência da morte eminente, não sei como irei reagir.
Em criança foi-me
inculcado o medo da morte. Via as pessoas chorarem nos velórios e nos funerais.
Pensava que o choro das carpideiras era dor verdadeira.
A recusa e o medo da
dor é real, sendo um elemento básico para a sobrevivência. Tinha, até à
experiência da guerra colonial, o medo de morrer.
Ensinaram-nos a ter
medo da morte. Ao mesmo tempo tentavam convencer-nos de que o “Depois” é um
estádio qualitativamente superior, para quem não for condenado aos infernos
(outra figura do tipo, Olha o velho do saco).
Não deveríamos ter, por esse motivo, medo da morte.
Mas fazer acreditar
que a “vida no céu” existe, cria naturalmente um estado de ansiedade, de
insegurança, devido ao medo de não se ser selecionado. Penso que é uma
manifestação de cariz cultural numa dimensão educativa.
Há pessoas que sendo
gnósticas, agnósticas e até ateias, morrem tranquilamente.
Mas o que é que de
concreto nos ameaça na morte? Nada! O “Desconhecido”
não existe, ninguém pode afirmar que ele está lá do outro lado à nossa espera.
O verdadeiro
desconhecido é algo inerente à vida real. Está presente no quotidiano.
É o ingrediente
essencial do instante seguinte. Na verdade somos especialistas no confronto com
o desconhecido. É o que nos alicia, nos convida a percorrer o caminho do
crescimento individual, das aprendizagens, da conquista do saber, da invenção
da amizade, da solidariedade, da ética, elementos entre outros, do percurso
para a evolução da espécie.
A morte, nada nos
rouba. Nem tão pouco deve abafar-nos de tristeza.
Desde que não
perspectivemos “o Além”, a morte constitui o epílogo, o momento último da vida
que tudo nos deu.
Eu gostaria de no
momento da morte, congratular-me com tudo o que tenho usufruído pelo facto de
viver. Com os benefícios que a aventura da humanidade me proporcionou.
Gostaria de no
momento da morte, sentir a doçura de enquanto amigo, professor, artista e
pensador, pai e avô, ter sido capaz de passar o testemunho àqueles que irão,
por sua vez, desempenhar o papel de portadores dos valores dignificadores da
vida e da existência em geral, contra a ignorância, a maldade, a cobiça, em
prol da harmonia entre os indivíduos e os povos, e destes com o planeta, de que
em última instância somos parte integrante.
Porque o céu está na
nossa consciência, e porque os infernos somos nós que por inépcia ou devido a
pressões externas, os fazemos, não descortino fundamentos para a existência nem
sinto a necessidade de um Deus, para me sentir em paz comigo e com o mundo,
para morrer tranquilamente quando chegar a hora.
09.49
(segue-se a
leitura do 3º parágrafo)
O que
permanece, são as suas consequências na consciência comum; na comunhão das
consciências…
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